Há muito tempo que não escrevo. Os dias, cheios de pequenas tarefas cosidas à preguiça e às horas de sono, derretem-se e vão para o passado. Um pouco de leitura, dois dedos de conversa, a busca de projetos que segurem a saúde mental e mais que se invente para homenagear a vida que estou vivendo. O coração vai batendo, protegido por exames médicos e moléculas de vários elementos que permitem respirar, amar e redigir estas palavras. Assim, o futuro é a hora de jantar e pouco mais. O logo é agora. Porque me encanto com as palavras?
Quando nos enfrentamos a nós próprios, uma pessoa que não conhecemos, um enervante estranho com quem vivemos durante todo tempo, mas que,na realidade, nunca quisemos conhecer, ficamos perante um vazio imenso. Então apoiamo-nos na nossa identidade pessoal, única e separada, sustentada pela nossa família, o nosso nome e por aí adiante. È nesse apoio frágil e transitório que confiamos a nossa segurança. Então, quando nos levarem tudo isso, faremos alguma ideia de quem na verdade somos? Mas nem sabendo isto, todo o tempo é gasto com barulho e atividades, por muito aborrecidos e triviais que sejam, para garantir que nunca ficaremos em silêncio na companhia do estranho em nós mesmo. E assim vivemos nesta aparência, longe da verdade suprema. Aquele encontro marcado aquando o primeiro choro e de que não temos conhecimento. Não nos ensinam que não somos daqui, que não somos separados e que não somos este corpo que nos conduz pelas estradas da Vida. Por isso o mêdo, por isso a dor de ter de partir. Para todos uma tábua de salvação: a certeza de que o Espírito é a nossa verdadeira Casa, onde sempre se vive em Amor.
Estes dias pequenos iludem o viver neles. Logo noite, logo sono, logo ceia e logo dormir. Parece que o sol se esqueceu de nós. O dia nublado põe o horizonte mais próximo e as nuvens pesam em nossos ombros. Ficamos apertados. Apetece chorar. Mas o inverno, como tudo na vida, passa. E assim, quando chegar a primavera, respiraremos melhor. Mas aí. teremos novos motivos de queixas, todos os anos repetidas. Porque chove e já não devia chover, porque o vento solta os pós e chegam as alergias e tantas mais manifestações da nossa ignorância colectiva. Afinal também estou dentro desta sombra ao escrever pensamentos que a ninguém interessam. Quem me ler que perdoe. Fica para outro dia um texto mais útil.
O ano que até ao fim vivi, devorou-me. Ou só me levou consigo? E para onde? De mim o que ficou? Serei eu completa? Ou apenas modificada? Nestas noites, sem sonhos nem pílulas para dormir, retornei à saúde e ao riso do passado. Imagino-me ante um mar azul, sentada numa cadeira de praia, a gozar o verão que há-de vir. E eu com êle, porque não senti o sol do verão que foi. E tenho saudades. O futuro que imagino, ter-me-à inteira, de novo. Estou lutando por isso.