O verão nasceu fraco, como se fosse um nasciturno prematuro. A Mãe Natureza trouxe no ventre ainda chuva e uma temperatura primaveril. O Sol, indiferente à nossa fome de calor, espera que as nuvens se dissolvam e a brisa apareça quente ao amanhecer. Nesta espécie de diário, vou deixando as impressões que cada hora me vai sugerindo. Por isso há assuntos diversos, desde olhar o mundo até sentir na pele o frémito causado por uma voz amiga. A consciência tudo admite e tudo regista, basta que façamos atentamente cada acto. Esta forma de viver é extremamente difícil, pois o ser humano vive e convive sem querer conhecer-se. Poucos são os que se perguntam, quem sou, de onde venho e para onde vou. Talvez aos poetas seja dado um sussurro, um encantamento, algo que os deixa numa encruxilhada, onde as almas vibram e se interpenetram no Amor que nos desperta. Sim, os Poetas...
Recordo as velhas redações da escola, onde sempre brilhei na composição e na imaginação. Algumas foram guardadas, o que muito me orgulhou quando as li. Uma delas foi sobre a "amizade". Mas o vocabulário era escasso e o conhecimento da matéria também. Vividos estes anos, posso provar como é volátil, enganosa, interesseira e superficial a amizade que nos envolve. É por isso, que doi tanto a partida de Amigos, que o foram durante setenta anos e só a morte ousou separar. E cada vez mais só, o coração vai batendo por todos. Até o esquecimento nos ajudar.
Foi curta a viagem. Muitas encruzilhadas, alguns labirintos. Percursos sinuosos, falsas objetivas. Enganos e acertos. E dentro do tempo que foi dado, muito iludi e muito acertei. Não sei se se redimiram velhas querelas, mas sei que muito de mim espalhei para o futuro. Não dei a mão como devia ter dado nem o coração se abriu quando o amor lhe pediu ajuda. Do pequeno e do grande guardo pouco. Do mundo tenho memória. Foi enorme tudo o que vi no olhar dos que amei ou julguei amar. O presente já não tem certezas. Cada acção só é visivel no fim do tempo que viveu. O céu é o amparo, onde o beijo do anjo se perde quando as mãos tentam segurá-lo. Mas o desejo terreno permanece.
As palavras que surgem não podem definir um domingo triste, mesmo que a luz do sol já entre no meu espaço. Foi boa a noite, a saúde está equilibrada, mas as reações fisicas têm falhas que me deminuem. Hoje até escrevo com erros ortográficos, o que me leva a ler cada som. Na verdade não tenho ideias para desenvolver sobre o que quer que seja e só o grande prazer em escrever me mantém agarrada ao teclado. Posso falar sobre os melros ou os pardais que estão pousando nas grades da varanda enquanto esperam por algumas migalhas. Posso falar sobre um primo-irmão que está deixando o seu lugar fisico, posso descrever outra mágoa maior, talvez não o queira fazer...Mas Domingo, mesmo triste, pode ser grande. Tentarei elevá-lo com a alma dentro dele. Bom dia.