É notável a capacidade de ousar, de intervir imaginando passado e presente num cruzamento quase didático, com poucas horas para tanto efeito e tanto afeto. Por tudo agradeço a uma equipe tão dedicada, que não prescindindo do seu trabalho diário, nos proporciona um ambiente diferente do habitual, com luxo na apresentação de cada acto festivo. O que sinto é alegria e gratidão por horas que, fazendo esquecer o peso da idade e até de abatimento emocional, nos podem divertir. Claro que vi olhares de critica. Nada altera o que aqui escrevo, como um diário um pouco infantil. Sobre a refeição também deixo o meu apreço. Perfeita confeção, perfeito o serviço. Os homens sonham e a obra.nasce. Este texto é de todos, que muito trabalharam pensando no agrado que iriam causar.
A criança que eu guardo em mim diverte-se com pequenas coisas. Mal acordo vou ver o novo que tenho no quarto, seja um desenho, uma planta ou algo que adquiri por diversão. Não sou infantil mas sempre gozei com o possivel, caro ou barato, seja um objeto ou uma ideia nova que queira concretizar. E assim vou levando pela mão a menina ou menino que vivem na minha companhia. É uma atitude romântica perante o lado escuro da vida. Tudo isto para explicar o gato preto com coleira vermelha encostado a uma pequena almofada feita em tecido de quadrados brancos e encarnados. Da mesma côr tem três corações, onde podemos idealizar nomes ou frases. O rabo do gato, fora da almofada, dá vida própria ao desenho do animal. Daqui vão os meus parabens às mãos que fabricaram esta graciosidade. Vieram do Brasil e por cá trabalham, dando muito de si a todos que com eles vivem.
Convoco a primavera porque é noite.
Estou a viver perfumes violetas
ou talvez aqueles raros,
com olfatos sobre a tua pele.
Chamando cada flor, recordo
e vou gozando o jardim
que fui criando em redor de mim.
Cheio de pedras, caminhos tortuosos,
mares alterosos,
Mas a par de tudo eu vivi
um jardim.
Podia pôr aqui um nome mas não quero.
Fico feliz porque tomo decisões.
È uma felicidade que desprezo
porque feita de ilusões.
E se a desprezo porque sou feliz?
Porque não quero usar teu nome,
aquele nome que apaga tudo,
que nem é nome de ninguém.
Que não é usado porque não
e outro o diz,
assim meu coração fala esse nome
porque eu quiz.
Espero-te. As árvores frondosas fazem sombra na relva fresca. Espero-te. Rigida estou e tremo também às vezes, sózinha como a noite em calafrios. Se viesses, o jardim seria um corredor liso e um grande silêncio nos abraçaria. Espero. Meus lábios entreabertos desejam o beijo final e finalmente o altar ardendo para o infinito. E espero. Pouso aqui e ali, como se viajasse pela imaginação fora de mim. Não encontro o lugar. Talvez esteja esquecido. A madrugada já é visivel. A espera é adiada. Espero-te amanhã.
Outro exame. A máquina a falar por nós. Os sentidos usados como argumento para não serem sentidos. Aqui podem ser um substântivo e também um tempo do verbo sentir. O nosso idioma é tâo rico em palavras que por vezes atrapalha. Tudo isto para expressar o pouco interesse que tenho em saber "mecanicamente" o que o corpo diz. Quando sofro de algum incomodo e peço ajuda, então aceito o que é proposto desde que esteja dentro razoavel para a minha idade. Mas assim, à revelia da dona, examinar-me só porque sim, não caio maís. Dedesto contrastes, máquinas ambulatórias, coisas estranhas que dizem de mim e que são chamadas meios de diagnóstico. Basta olhar, pedir data de nascimento. Confirmam-se as queixas de acordo com a doença. De uma vida longa, cheia de trabalho, de amarguras e de perdas e o diagnóstico é fácil e correcto: é velho, está gasto. Cotra isto nada podemos fazer senão viver tranquilamente os dias que ainda restam. E se souber amar a Vida, melhor, muito melhor.