no silêncio da alma. E atravessei planícies, sobrevoei montanhas até ao mar. No silêncio da alma -ainda o silêncio- em extase e o espanto, o mar. O berço a balançar nas ondas. O que serei nesta alma em silêncio? Para onde me devo deixar levar - o mar - no silêncio da minha alma?Criador que me criaste e aqui me deixaste sem bússula para o regresso, indica-me o atalho, o sonho ou a maré para chegar a casa, levando na arca da Vida o que foi possivel cumprir. A arca está repleta do silêncio e eu vou andando como posso.
Gritos. Vozes exaltadas. A velhice doi e chora. Clama pela morte. Ela não vem. Vem a enfermeira e auxiliares. Há quem continue a conversar, talvez para manter a calma. Não por indiferença, mas para que a sala de refeições seja um exemplo de boa educação em sociedade. Caiu o silêncio. Tudo normal. Falar e rir em cada mesa. Eu estou só num lugar e conhecendo quem sofria, o coração cresceu pela piedade, enquanto o pensamento se retorcia entre o medo e a certeza do que virá um dia. Até porque sei que a reação violenta tinha origem em dores de família. Toda a tarde tenho tido esta lembrança. São espelhos que servem para manter a humildade na existência de todos e cada um.
Com lágrimas ou sem elas podemos chorar. Assim é hoje um país inteiro. Unido na dor da perda, unido pelo espanto. Todos falamos sobre o mesmo homem, que a todos deu horas de alegria e muito riso. Cujo rosto todos conheciamos e cuja presença bastava para nos prender. Por todo o mundo que fala português se diz o seu nome e se fala sobre o homem, o amigo, o artista. Que maravilha ter vivido de forma que a sua morte seja uma fatalidade nacional.
Todos os dias procuro ver as pequenas chamas que me orientam até à hora de a elas me juntar. Mas não estão visiveis, ainda que eu saiba que são presentes na minha vida. Para muitas pessoas estas afirmações são apenas devadeios de quem vive com a cabeça no céu e os pés na terra. De quem usa a poesia para lhe suavisar o dia a dia, usufruindo também de algum conhecimento sobre a maravilha que somos agregados à Mãe Terra,de que fazemos parte. Felizmente, muitas pessoas pelo mundo, são observadoras átivas destes "milagres", que se devem só à alta espiritualidade de quem os pode observar. Alimentação especial, meditações, dedicação aos elevados Seres que lhe abrem os caminhos que mais tarde servirão a humanidade. Em todas os idiomas circulam livros com testemunhos assombrosos de há centenas de anos até aos nossos dias. Não haverá autores dignos de confiança? Não somos todos aspirantes à eternidade? Porque será?
Além de ser uma palavra bonita em termos de sonoridade é o também quanto ao seu significado. Pode ser uma tristeza leve, um estado de espírito pouco definido e isento de alegria e muitas mais aparentes situações que a lingua portuguesa abrange. Hoje surgiu-me a "melancolia" como título por sentir algo que é o quase que não chega a ser. Nem por isto, nem por aquilo. Horas de dúvidas embrulhadas naquilo onde mais me apoio: a confiança que tenho em mim. Analiso as minhas atitudes, o que desejo ou não, para ter utilidade como ser social e de amor pela vida. Nestes desabafos públicos, sou alguém que podendo ser lida e criticada, também me é indiferente que isso ocorra ou não. Cheguei ao fim deste pequeno raciocínio a vejo que nada disse. Apenas a melancolia prevalece.
Há sete anos que entrei nesta casa para ser minha. Fechei um ciclo e de novo comecei uma parte do meu tempo. Esforço-me por viver bem no meu silêncio natural. As falas são contidas, os sorrisos são simples e o respeito completam os dias. A proteção é cem por cento. O conforto também. Estes adjetivos já são repetidos. Nada de novo além do meu tempo, cada vez menor e cada vez mais interior. Sou chamada a novas ciladas e para sair delas recorro a tudo. Desde ao pensamento subjetivo, sem subtância ou forma, até à prece dirigida a um céu que nem sei se existe. Tudo isto dá cor à vida e quando adormeço tenhos os sonhos como ajudas inesperadas. Por tudo festejei o dia de ontem a beber um café em uma esplanada, ao sol de inverno.