Há dias vazios de nós, ou melhor, vazios da presença de si. Este si, que é o conhecimento de existir, parece esvaziar-se perante a consciência. Esta mania de pensar sobre sentimentos e acontecimentos inesperados dá uma ilusão de poder sobre mim que não corresponde ao que eu conheço. Hoje chegou um esquecimento, o primeiro da minha vida e que foi deixar de comparecer a um encontro, combinado por mim na véspera. Após o telefonema de quem me aguardava, corri envergonhada e admirada pela falta de memória. As diferenças são notórias, desde a indifrença até ao esquecimento. Tenho de estar alerta concentrado-me no que vou fazendo, como se de um jogo se tratasse. Gostava de rimar muitas palavras, cujos sons me são agradáveis, uma forma de brincar e não esquecer. Afinal ainda há teorias que podem ser úteis à memória.
Há muita juventude na gerência desta Casa. E mulheres. E mães. Hoje soube que está a caminho, no útero do Mistério, alguém que não se sabe quem é e porque vem e para o que vem. E porque escolhe esta mulher para o receber. Quando é posta socialmente a frase "que ninguém pede para nascer", é evidente a contradição a outra forma de falar que elege o Destino como acontecimentos mais ou menos fatais. Outras formas de descobrir e enconbrir as opções que vamos tomando e às quais o destino está associado, são as crenças religiosas em qualquer parte do mundo. Quase todas as religiões envolvem o Poder da Vida numa cortina de ignorância, de temor e castigo, dificil de ultrapassar. Mas a grandeza que nos rege ensina que há em todo o ser vivo uma luz interior que ilumina cada processo como um destino combinado. Por isso vem de antes de ser feto a luz que o traz aqui, por isso a Vida é sagrada, por isso a Vida é eterna. E quando esse desconhecido chegar, seja ou não parecido fisicamente com quem lhe deu (sem saber) a oportunidade de entrar neste mundo, o Amor será seu berço e o Universo a sua Escola. Espero poder vê-lo, se o tal destino o permitir.
o ar move-se e é vento
o mar ondula e é maré
a hora é manhã e é tempo
o teu lugar já não sei onde é
a mão protetora que foi tua
ainda é o que foi e tua é
o espaço/tempo pode ser lua
o que fomos já não sei o que é.
À porta de casa espero sentada.
Talvez até ti eu conheça a estrada.
Quando me preparo para escrever, sempre recordo os meus amores, os amores do dia a dia, antigos ou recentes. Claro que não memorizo cada rosto, porque alguns já são figuras fugidias que o tempo deixou no coração. Mas a Vida vai trazendo novas pessoas que eu vou amando, umas porque são jovens e enchem a alma, outras porque estão próximas de mim e também precisam de carinho. Assim perco o motivo que me trouxe à escrita e tenho de inventar tudo de novo. Gosto de pensar nos contactos humanos e como todos interferimos nas vivências uns dos outros. Uns mais intervêntivos, outros apenas de passagem. Sendo cada um de nòs ator maior na condução da nossa vida, há sempre outros que muito a condicionam. A esses também agradeço. Porque me fazem olhar para mim e aprender que a Vida não é distração ( como muitos dizem e pensam), mas uma missão que devemos descobrir em nós. Julgo que essa descoberta nos traz a paz que todos desejamos.
Encosto-me ao tempo e deixo-me levar neste cansaço que me invade. Entre o querer pensar, o querer decidir e o querer atuar para fazer algo, há uma vontade enfraquecida pelo calor. O sono aparece e o corpo pesa mais sobre o acolhimento do sofá. Quero ir mas nem sei aonde. Neste pequenos diários que não quero que o sejam, pois não gosto de classificar o que faço, falo apenas das fraquezas do corpo por não ser capaz de as fortalecer rapidamente. Quem dera sentir de novo a força do passado...! Cada dia se estreita mais a limitação ao movimento e portanto à possibilidade de um gesto solto ou de um passo rápido. Eu quero mas não posso em contraste com o que foi, eu posso mas não quero. O calor faz-me perder o dia. E por aqui me vou, em linguagem antiga.