Passa quem passa.
Fala quem fala.
O vento leva os sons
de quem passa.
Cantam os pardais.
Há pés que se arrastam
e há vozes caladas.
Eu estou comigo
no lugar de sempre,
pensando, pensando.
E vejo o lugar vago
de tanto pensar.
Sou a doida do tempo
Velha para começar.
Passa quem passar
neste jardim cercado
de janelas fechadas,
vive quem vive
sem me dizer nada.
Quando eu penso que a família acabou, aparecem umas primas velhas e umas velhas primas, que eu não chamei nem reconheço como tal. E falam de assuntos das suas crias e de doenças e dos nossos avós, irmãos desentendidos, com os preconceitos de há cem anos .Estas conversas são tristes e não alimentam a minha vida. Fiquei cansada, doente de raiva por não ter dito basta à visita inesperada. Prometem voltar. Terei paciência? Hoje penso no verão que entra hoje, timido e com chuva para domingo. O tempo está maluco como eu ou eu estou maluca como o tempo. Só malucos podem escrever textos como este. Dá vontade de chorar...
Caiem sobre mim com a força de uma vaga. Para entender o que vem devo regressar ao Amor que me deram e que eu senti por tudo que recebi. Assim defino as heranças que me enriquessem de que cada vez que um novo familiar me contacta. Família de sangue já partiu, mas vão surgindo os filhos, os netos e bisnetos de quem me inclui no seu agregado familiar. Pessoas unidas pela vida à minha vida e assim há amizade de muitos anos até ao fim. Alguns conheci quando crianças mas perdi-os nos caminhos diversos. Quando me abraçam sinto o calor do jovens neste corpo velho e a alegria de ainda os ver, Saber que me identificam como família é bom e alimenta a alma.
a minha avó sempre se vestiu assim,
assim como a flha,
assim como a mãe,
o corpo coberto assim,
tal como a filha,
tal como a mãe.
E porque era assim,
o lenço no cabelo,
o trabalho na mão,
E porque era assim
eles só mandavam
e elas trabalhavam.
Ganhavam o pão.
Dias depois eu nasci
e logo disse ASSIM NÃO.
Vou ter contigo à estrada.
Levo comigo o que mais amavas
e levo as dores para serem lidas.
Iremos os dois de mãos dadas
cobrar à Vida o combinado,
quando ainda não sabiamos
se os olhares se viam ou se cegavam.
Iremos ao encontro velhos, gastos.
Talvez nos conheçamos,
Talvez não. Talvez nos unamos
Pelo calor de cada mão,
No desejo de descobrir o mistério da nossa existência, oramos, bebemos tisanas, estudamos códigos e até lemos as cartas e as sinas. Hoje encontrei o colibri como energia, vibrando numa vibração perto da minha. Como tudo e todos vibram num campo energético comum embora em diferentes vibrações, cada ser vivo pode estar cognetado a outros, tirando ou distribuindo "vida" nesse campo desconhecido, a que damos nomes indecifráveis. Há nesta energia fé, idealismo, riso e muito mais. E no seu contrário tudo que o oposto provoca. Achei graça ao pequeno pássaro e à ideia de o ter à cabeceira. Há dias assim...!
Já não são crianças. Adolescentes, aplicadas no estudo, fazendo desporto e caídas do céu. Conversam e escrevem bem. Recebi um belo poema que nos une pelo prazer de escrever e ler poesia. Depois desta troca de palavras cheia de sentimento, ficamos mesmo avó e neta. Amanhã escreverei uma carta a agradecer a visita e tudo que esta visita nos traz às nossas vidas. Com a experiência que hoje tenho, sei que este contacto exige a maior delicadeza nas palavras e nas manifestações de carinho. Cada dia dirá se o meu procedimento está correto.